Capítulo 01 – a passagem de um milênio
O ano era 1999, minhas preocupações se resumiam em estudar e aguardar o momento em que minha mãe terminaria suas tarefas domésticas para podermos sair e eu brincar na rua. Jogos que agora são considerados “vintage” como garrafão, pega-pega, atrepa, esconde-esconde e a tão esperada roda chinela, eram as estrelas das minhas noites.
Por falar em preocupação vivíamos sob a sombra de previsões catastróficas feitas por supostos videntes, alertando sobre um iminente desastre que ocorreria na virada do milênio. Aprendi, com o tempo, a não dar atenção a essas previsões que jamais se concretizaram.
Lembro também das mães sempre atentas, intercalando fofocas com conselhos sobre nossas travessuras infantis. Suas vozes ecoavam: "Cuidado para não cair", "A bola está sendo chutada forte demais", "Parem de gritar, vão acordar os vizinhos".
Na ingenuidade própria da infância, ensaiávamos uma dança que se tornara parte do nosso folclore de rua. A tradição ditava que, pontualmente à meia-noite de cada 31 de dezembro, apresentaríamos nossos passos desajeitados (falo por mim) ao som da música que marcava aquela época.
Dando um next em nossa história, em março do novo milênio, me vi dentro de um carro de mudança, questionando se a grande tragédia prevista pelos antes "pseudos" videntes seria, na verdade, minha partida definitiva daquela rua que já fora o cenário de minha infância feliz.
Tal questionamento logo se transformou em uma certeza, quando, após 30 minutos de viagem, cheguei ao nosso novo endereço. Os videntes haviam acertado. Num novo lar, dei início às desventuras da adolescência. Posteriormente, mudamos novamente e, em um novo endereço, adentrei nas desventuras da vida adulta, uma fase serena, porém, muitas vezes monótona.
Até que um dia, após visitar nossa antiga rua, minha mãe retornou eufórica, anunciando seu desejo de voltar à nossa tão lembrada "Rua Goiânia". E assim, com entusiasmo, empreendemos o retorno à mesma rua, agora em uma nova casa, para convivermos novamente com as mesmas pessoas que moldaram nossas lembranças. Teríamos nós, após 22 anos, feito uma boa escolha?